sábado, 22 de fevereiro de 2020

O PAÍS DO CARNAVAL - Jorge Amado


LEITURAS CARNAVALESCAS II

O País do Carnaval conta a história de Paulo Rigger, um brasileiro, nascido na Bahia e que vai a pedido do pai estudar na Europa e por lá fica alguns anos. Ao retornar para o Brasil, Paulo inicia sua jornada buscando dar conta de suas inquietações, de descobrir do significado da felicidade e do sentido da vida. Conhece alguns intelectuais com que estabelece vínculos de amizade e de genuína parceria intelectual. Nos botecos de Salvador o grupo mantem encontros casuais e passam a vida e discutir sobre política, amor, religião e filosofia. Nesse tortuoso caminho que o faz ver o Brasil tal qual o próprio carnaval, cheio de contradições, Paulo Rigger segue uma trajetória que oscila entre transcendência intelectual e acomodação à sua condição de homem burguês, branco e rico. 

Durante esse tempo no Brasil, ele também conhece as alegrias e dores do amor e quando se vê diante de um dilema que coloca em xeque suas convicções intelectuais, nos mostra seu caráter conservador e machista, incapaz de transpor a linha confortável do discurso intelectualizado burguês tão contraditório quanto o país que ele chama o tempo todo de país do carnaval. Um personagem no mínimo intrigante.  

Obra inicial

Este foi o livro de estreia de Jorge Amado aos 19 anos, no ano de 1931. Aqui se apresenta um escritor crítico e talentoso, interessado em questões como identidade, política, mestiçagem, racismo e cultura popular. Todo o embrião de uma vasta obra que conheceríamos nos anos posteriores. Este livro tem um enredo bem simples,  no entanto  a inquietação intelectual e sentimental do protagonista e seu profundo dilema entre razão e emoção, faz do romance juvenil uma obra substancial e revela um autor já preocupado com o enigma Brasil. Penso até que Paulo Rigger, protagonista do romance, se assemelha em partes com o espírito inquieto e juvenil de seu criador que aos 14 anos já figurava na cena literária de Salvador e foi um dos criadores da "Academia dos Rebeldes", que publicava trabalhos em revistas criadas por eles mesmos.

Gostei do livro. Fiquei com a impressão de que naquele momento aos olhos do autor o Brasil era ainda apenas uma festa, mas não qualquer festa. Uma festa completa com música, beleza, gente alegre, muita bagunça, embriaguez coletiva e a funesta melancolia do dia seguinte; ressaca de um povo diferente e misturado, sobreviventes de uma nau meio sem rumo, com capitão errante, tripulação desgraçada e brincante que não se importa muito onde vai chegar, no entanto insiste em partir. Uma narrativa intrigante, criativa, crítica, e com desfecho um pouco pessimista, na minha avaliação.


Sobre o Autor:

Jorge Amado é mais que um clássico da literatura brasileira, sobretudo da literatura que retrata o Brasil-Bahia, o Brasil- Crioca, o Brasil-Brasil, a cultura popular do povo mestiço e dos infortunados e abandonados do sistema capitalista. Crítico e ousado, trouxe para sua obra nuances da rica diversidade da cultura popular brasileira. Um escritor atemporal, cuja obra já foi publicada em mais de 50 países e é talvez o escritor mais adaptado da dramaturgia brasileira. 


Karina Guedes
@okarapoetica


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quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

ANTES DO BAILE VERDE - Lygia Fagundes Telles


LEITURAS CARNAVALESCAS I

Adoro contos! Sem dúvida é um dos meus gêneros favoritos e Antes do Baile 
Verde é um livro excelente que nos permite experimentar um pouco da deliciosa prosa de Lygia Fagundes Telles. 

Cada história, um mergulho na astúcia e talento da autora em capturar nossa atenção e nos intrigar com dramas envolventes. Inveja, ódio, amor, posse, ciúmes e malícia, entre provocações e reflexões, as histórias são cheias de ironias acerca do comportamento humano e de nosso senso de humanidade, ou falta dele. Seus personagens são revelados em detalhes, ficando nus e expostos ao nosso olhar ora surpreendido, ora desconfiado, mas sempre curioso com o próximo passo. A sinestesia é uma das principais figuras de linguagem utilizadas nos contos de Lygia: a cor verde é constantemente citada como referência à passagem da vida à morte; às vezes, alude à esperança, à inveja e ao dinheiro.

O conto que dá nome ao livro, é um convite a reflexão sobre vida e morte, responsabilidade e fuga da realidade, contradições internas alegoricamente representada simbolicamente por nossa festa mais popular, o carnaval. Que serve de pano de fundo para o desenvolvimento do drama de duas mulheres de classes distintas e opostas diante de um dilema ético cujo desfecho não é nem um pouco o mais esperado.  Já o conto Verde Lagarto Amarelo expõe a fragilidade das relações familiares, uma perturbadora narração de um personagem passivo/violento que dilacera seu inimigo com palavras afiadas e cortantes. E assim, sucessivamente cada história nos dá a breve sensação de uma viagem ao mundo peculiar de cada protagonista, seus anseios e devaneios, medos e loucuras, seus sofrimentos e contradições.  Antes do baile Verde reúne contos escritos por Lygia entre 1949 a 1969 e são apresentados em ordem decrescente do mais antigo ao mais recente.

Para quem ainda não conhece a vasta obra da autora, este pode ser um bom começo. E se ao final da leitura você sentir um desconforto estomacal e ao mesmo tempo uma sensação de euforia, não se preocupe. Significa apenas que você se embriagou com as 18 doses de Lygia Fagundes Telles, servidas no livro.


Sobre a autora:
Lygia Fagundes Telles dispensa apresentações. Premiada escritora brasileira, considerada por acadêmicos, críticos e leitores uma das mais importantes e notáveis escritoras brasileiras do século XX e da história da literatura brasileira. Além de advogada, romancista e contista, Lygia tem grande representação no pós-modernismo, e suas obras retratam temas clássicos e universais como a morte, o amor, o medo e a loucura, além da fantasia.


Karina Guedes
@okarapoetica


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